quinta-feira, 14 de junho de 2012
O meu "caralho".
Fui atingida na costela. É incrível como uma coisa tão pequena pode fazer um estrago tão grande. Senti a bala rasgando minha pele e perfurando o osso. Senti o sangue se esvaindo e o coração falhar. Senti o pulsar nas têmporas e o ar lutando pra entrar e sair do pulmão. Senti o chão frio e o baque poeirento que meu corpo fez ao cair. Ao mesmo tempo, não senti nada. Diversas vezes, vi pessoas revivendo suas lembranças momentos antes de morrer. É o que filmes e livros mostram. Você provavelmente também viu, e sinto por estragar o seu barato, mas não é bem assim. A morte é fria, rápida, indolor. Não se pensa no primeiro tombo de bicicleta quando se tem uma faca enfiada no fígado, ou uma bala perfurando o cérebro. Ninguém lembra do casamento no meio de um ataque cardíaco ou durante as capotadas de um carro. Não há tempo para memórias. O máximo que sai é uma palavra e pum, tá morto. A palavra que a maioria das pessoas pensa deve ser "caralho". Minha palavra foi seu nome. Naquelas infinitas e intermináveis frações de segundos, pensei em você. Não foi como se eu tivesse ficado horas ignorando o fato de ter uma bala na costela e parado pra pensar em você, e sim como se você tivesse se enfiado a força na minha mente, como sempre fez, até o último minuto. Pra provar que quem manda é você, não importa quando ou onde. Passei minha vida inteira não ligando pra morte. E ali, prestes a abraça-la, não quis o que a maioria das pessoas quer ao cair nos braços da morte. Não quis viver. Pra mim tanto fazia. A única coisa que eu realmente quis, e merda, como quis, era você. Era te ver uma última primeira vez. Desejei, com toda a força que restava no que me restava de corpo, que você fosse a morte.
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